A VERDADE
SOBRE O ENEM
Carlos
Henrique Marques
O ENEM (Exame Nacional do Ensino
Médio) teve sua primeira etapa realizada ontem. Milhões de jovens foram
realizar a prova e “provar” o seu saber. O tema da redação foi sobre a manipulação
dos usuários da internet através do controle de dados. O tema jamais seria “o
que é o ENEM, por qual motivo ele existe, quais seus objetivos e consequências”.
Esses milhões de jovens foram submetidos ao sofrimento psíquico, processo de
ansiedade, nervosismo, etc. E isso se agrava cada vez mais numa sociedade cada
vez mais competitiva.
O Enem é expressão de uma dos
elementos da sociabilidade capitalista: a competição. Milhões de jovens
competindo por vagas nas universidades. Mas não são apenas “vagas nas universidades”.
O que está em jogo é o futuro desses jovens. O futuro profissional que, por sua
vez, determina muitas outras coisas na vida deles (renda, amizades, cultura,
etc.). E nessa competição, apenas os “melhores” vencerão. Dos mais de cinco
milhões de jovens, restarão poucos. Os vencedores irão festejar, postar fotos
nas redes sociais, ficar contentes com a vitória. Mas essa é apenas uma
competição. Quando entrarem na universidade, vão enfrentar outra competição com
seus colegas e a maioria vai ser derrotada. A maioria não conseguirá nem
terminar o curso. Uma parte conseguirá, mas não vai exercer a profissão para a
qual se formou, vai migrar para outra área (alguns, inclusive, vão fazer um
segundo ou terceiro curso), ficar no desemprego ou subemprego (para aqueles
oriundos das classes trabalhadoras). Uma parte vai prosseguir na competição no
interior da profissão, prestando concursos públicos, buscando vagas em empresas
privadas, etc. E sendo novamente “vitoriosos”, terão que continuar competindo,
agora com os colegas de trabalho, pela ascensão de cargo, pela fama, pelo
aumento salarial, etc. Os fracassados do Enem serão esquecidos, não estarão nas
redes sociais. Certamente, estarão tristes, alguns chorando, no escuro do seu
quarto. Alguns esperando o ano seguinte para sofrer novamente e sonhar novamente
com a vitória num processo em que quem ganha ainda terá que continuar ganhando e
sofrendo e assim permitir que a máquina capitalista continue funcionando.
O Enem é um grande processo competitivo
e como toda competição na sociedade capitalista, aqueles que são oriundos das
classes trabalhadoras, com menor bagagem cultural (proveniente da família,
amizades, experiências, etc.), dificilmente ganham e continuam ganhando, enquanto
que aqueles, das classes supérfluas (burguesia e suas classes auxiliares), com
sua maior bagagem cultural, tendem a ganhar e seguir competindo.
O Enem é também uma perversão da educação.
E isso em duplo sentido. O primeiro sentido é a de que o Enem, assim como o
processo educacional em geral na sociedade capitalista, transforma a formação
intelectual em meio e assim ela deixa de ser um fim. A educação é um meio para
satisfazer outras necessidades, tais como emprego, ascensão social, renda, status,
etc. Os jovens não estudam por curiosidade, por vontade de aprender e conhecer
o mundo, para desenvolver suas potencialidades intelectuais e sim para ser
aprovado, ter notas, conseguir passar no Enem. Os interesses dos jovens,
constituídos socialmente na sociedade capitalista, mostram a degradação do
processo de formação intelectual na modernidade. E a mercantilização acompanha
esse processo: cursinhos, especialistas, sites, escolas, lucram com isso. Uns
pagam (os estudantes e suas famílias), outros lucram (as escolas, cursos
preparatórios, etc.).
O segundo sentido é a burocratização
governamental. Na época dos vestibulares, havia uma pluralidade no processo seletivo,
que variava da universidade para universidade, agora há um único exame nacional
e controlado pela burocracia governamental. O Enem foi gestado, de forma
embrionária, no governo neoliberal de Fernando Henrique Cardoso, mas ganhou
forma definitiva com o governo neoliberal neopopulista de Lula, cujo ministro
da educação era Fernando Haddad. No início, a ideia era saber das competências
e habilidades e ter uma radiografia do ensino médio, de acordo com a cartilha neoliberal
para educação, depois passou a ter o papel seletivo geral nas universidades
federais e na concessão de bolsas nas universidades particulares e, algo pouco
visível, um projeto de hegemonia governamental. Através de um exame nacional é
possível mobilizar milhões de jovens para se pensar o que o governo quer que
eles pensem e isso através das questões e da redação exigida e que tem peso fundamental
no processo seletivo. Vão mobilizar inúmeras escolas preparatórias, cursinhos,
professores, para reproduzir regrinhas e discursos impostos aos estudantes e
que depois eles irão reproduzir alegremente e achando que brotaram de suas jovens
cabeças pensantes. Assim, os temas de redação do Enem foram “petistas” e, em
2018, foi “temerista” e a partir do ano que vem, até quando durar o novo
governo, será “bolsonarista”. O Estado neoliberal é tão controlador e
burocrático quanto qualquer outra forma assumida pelo estado capitalista.
É por isso que o Enem é um
retrocesso educacional, uma uniformização ditada por semiditadores educacionais
reprodutores de interesses governamentais a serviço da reprodução capitalista. É
por isso, também, que o Enem deve ser abolido. Mas para isso ocorrer é necessário
que a população decida isso e para tal é preciso formação. Ora, o aparato
estatal e a burocracia governamental não pretendem fornecer formação crítica.
Por isso, é preciso criticar o Enem e o processo educacional capitalista em
geral e, ao mesmo tempo, buscar outras formas de autoeducação e formação intelectual
e política. A abolição do Enem não resolverá o problema do capitalismo, pois em
seu lugar surgirão outras formas capitalistas de seleção, mais ou menos
destrutivas psiquicamente, mais ou menos injustas, ou seja, variando quantitativamente
mas não qualitativamente. Por isso, o fundamental é a abolição da sociedade que
gera essa pseudoeducação que serve para a reproduzir. A abolição do capitalismo
é o objetivo fundamental e a única solução para este e milhares de outros
problemas sociais que destroem os seres humanos. A substituição dessa sociedade
desumanizada por uma sociedade humanizada significa a humanização da educação,
da formação. Na sociedade autogerida, os males da educação capitalista se
tornarão relíquias do museu da pré-história da humanidade.
top. Enem é uma nojeira, todo ano essas pautas progressistas, e milhões de pessoas, mesmo não concordando, tem que engolir essa merda e mentir na redação pra passar.
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