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segunda-feira, 5 de novembro de 2018

A Verdade sobre o ENEM



A VERDADE SOBRE O ENEM

Carlos Henrique Marques

O ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) teve sua primeira etapa realizada ontem. Milhões de jovens foram realizar a prova e “provar” o seu saber. O tema da redação foi sobre a manipulação dos usuários da internet através do controle de dados. O tema jamais seria “o que é o ENEM, por qual motivo ele existe, quais seus objetivos e consequências”. Esses milhões de jovens foram submetidos ao sofrimento psíquico, processo de ansiedade, nervosismo, etc. E isso se agrava cada vez mais numa sociedade cada vez mais competitiva.

O Enem é expressão de uma dos elementos da sociabilidade capitalista: a competição. Milhões de jovens competindo por vagas nas universidades. Mas não são apenas “vagas nas universidades”. O que está em jogo é o futuro desses jovens. O futuro profissional que, por sua vez, determina muitas outras coisas na vida deles (renda, amizades, cultura, etc.). E nessa competição, apenas os “melhores” vencerão. Dos mais de cinco milhões de jovens, restarão poucos. Os vencedores irão festejar, postar fotos nas redes sociais, ficar contentes com a vitória. Mas essa é apenas uma competição. Quando entrarem na universidade, vão enfrentar outra competição com seus colegas e a maioria vai ser derrotada. A maioria não conseguirá nem terminar o curso. Uma parte conseguirá, mas não vai exercer a profissão para a qual se formou, vai migrar para outra área (alguns, inclusive, vão fazer um segundo ou terceiro curso), ficar no desemprego ou subemprego (para aqueles oriundos das classes trabalhadoras). Uma parte vai prosseguir na competição no interior da profissão, prestando concursos públicos, buscando vagas em empresas privadas, etc. E sendo novamente “vitoriosos”, terão que continuar competindo, agora com os colegas de trabalho, pela ascensão de cargo, pela fama, pelo aumento salarial, etc. Os fracassados do Enem serão esquecidos, não estarão nas redes sociais. Certamente, estarão tristes, alguns chorando, no escuro do seu quarto. Alguns esperando o ano seguinte para sofrer novamente e sonhar novamente com a vitória num processo em que quem ganha ainda terá que continuar ganhando e sofrendo e assim permitir que a máquina capitalista continue funcionando.

O Enem é um grande processo competitivo e como toda competição na sociedade capitalista, aqueles que são oriundos das classes trabalhadoras, com menor bagagem cultural (proveniente da família, amizades, experiências, etc.), dificilmente ganham e continuam ganhando, enquanto que aqueles, das classes supérfluas (burguesia e suas classes auxiliares), com sua maior bagagem cultural, tendem a ganhar e seguir competindo.

O Enem é também uma perversão da educação. E isso em duplo sentido. O primeiro sentido é a de que o Enem, assim como o processo educacional em geral na sociedade capitalista, transforma a formação intelectual em meio e assim ela deixa de ser um fim. A educação é um meio para satisfazer outras necessidades, tais como emprego, ascensão social, renda, status, etc. Os jovens não estudam por curiosidade, por vontade de aprender e conhecer o mundo, para desenvolver suas potencialidades intelectuais e sim para ser aprovado, ter notas, conseguir passar no Enem. Os interesses dos jovens, constituídos socialmente na sociedade capitalista, mostram a degradação do processo de formação intelectual na modernidade. E a mercantilização acompanha esse processo: cursinhos, especialistas, sites, escolas, lucram com isso. Uns pagam (os estudantes e suas famílias), outros lucram (as escolas, cursos preparatórios, etc.).

O segundo sentido é a burocratização governamental. Na época dos vestibulares, havia uma pluralidade no processo seletivo, que variava da universidade para universidade, agora há um único exame nacional e controlado pela burocracia governamental. O Enem foi gestado, de forma embrionária, no governo neoliberal de Fernando Henrique Cardoso, mas ganhou forma definitiva com o governo neoliberal neopopulista de Lula, cujo ministro da educação era Fernando Haddad. No início, a ideia era saber das competências e habilidades e ter uma radiografia do ensino médio, de acordo com a cartilha neoliberal para educação, depois passou a ter o papel seletivo geral nas universidades federais e na concessão de bolsas nas universidades particulares e, algo pouco visível, um projeto de hegemonia governamental. Através de um exame nacional é possível mobilizar milhões de jovens para se pensar o que o governo quer que eles pensem e isso através das questões e da redação exigida e que tem peso fundamental no processo seletivo. Vão mobilizar inúmeras escolas preparatórias, cursinhos, professores, para reproduzir regrinhas e discursos impostos aos estudantes e que depois eles irão reproduzir alegremente e achando que brotaram de suas jovens cabeças pensantes. Assim, os temas de redação do Enem foram “petistas” e, em 2018, foi “temerista” e a partir do ano que vem, até quando durar o novo governo, será “bolsonarista”. O Estado neoliberal é tão controlador e burocrático quanto qualquer outra forma assumida pelo estado capitalista.

É por isso que o Enem é um retrocesso educacional, uma uniformização ditada por semiditadores educacionais reprodutores de interesses governamentais a serviço da reprodução capitalista. É por isso, também, que o Enem deve ser abolido. Mas para isso ocorrer é necessário que a população decida isso e para tal é preciso formação. Ora, o aparato estatal e a burocracia governamental não pretendem fornecer formação crítica. Por isso, é preciso criticar o Enem e o processo educacional capitalista em geral e, ao mesmo tempo, buscar outras formas de autoeducação e formação intelectual e política. A abolição do Enem não resolverá o problema do capitalismo, pois em seu lugar surgirão outras formas capitalistas de seleção, mais ou menos destrutivas psiquicamente, mais ou menos injustas, ou seja, variando quantitativamente mas não qualitativamente. Por isso, o fundamental é a abolição da sociedade que gera essa pseudoeducação que serve para a reproduzir. A abolição do capitalismo é o objetivo fundamental e a única solução para este e milhares de outros problemas sociais que destroem os seres humanos. A substituição dessa sociedade desumanizada por uma sociedade humanizada significa a humanização da educação, da formação. Na sociedade autogerida, os males da educação capitalista se tornarão relíquias do museu da pré-história da humanidade.

Um comentário:

  1. top. Enem é uma nojeira, todo ano essas pautas progressistas, e milhões de pessoas, mesmo não concordando, tem que engolir essa merda e mentir na redação pra passar.

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